10 anos sem o jornalista Fausto Wolff



10 anos sem o jornalista Fausto Wolff
Sergio Caldieri*


O povo Palestino e os oprimidos do Terceiro Mundo perderam o seu
maior defensor em dia 5 de setembro de 2008, no Rio de Janeiro. O
jornalista e escritor Fausto Wolff morreu aos 68 anos por disfunção
múltipla dos órgãos. Ele nasceu em Santo Ângelo (RS), em 17 de outubro
de 1940, com o nome de Faustin von Wolffenbüttel, e aos 14 anos
começou a trabalhar como repórter de polícia no Diário de Porto Alegre.
Aos 18 anos, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde trabalhou nas revistas
O Cruzeiro e Manchete e nos jornais O Globo, JB e Tribuna da Imprensa.
Durante 52 anos de carreira jornalística incomodou muita gente com suas
matérias criticando todos os eternos poderosos que massacravam e
sugavam a população mais pobre e injustiçada. Fausto sempre foi o porta-
voz dos oprimidos e pagou um preço muito caro por defender a causa
palestina nos últimos 30 anos. Bastava ser considerado comunista para
viver como um marginalizado na imprensa e ter que sobreviver na
imprensa alternativa.
Durante o regime militar teve que se exilar na Dinamarca e Itália, onde
deu aulas de literatura em duas universidades, em Copenhague e
Nápoles.Trabalhou nos mais importantes jornais e revistas brasileiras. Em
1969, fez parte da equipe do mais combativo jornal O Pasquim que
durante a ditadura militar (1964-1985), incomodou os ditadores militares
de plantão. Com um grupo de jornalistas fundou o jornal Tribuna
Socialista, considerado o primeiro jornal de esquerda depois da ditadura.
Trabalhou em programas de televisão onde falava dos problemas
políticos, culturais e internacionais.
Fausto Wolff escreveu mais de 20 livros de vários temas: políticos e
romances, e era considerado um dos maiores romancistas brasileiros
quando foi consagrado com o Prêmio Jabuti pela sua obra ‘À mão
esquerda’. Nos últimos anos fazia traduções de livros, pois dominava
muito bem o alemão, inglês, francês, espanhol e italiano.
Fausto dizia que a esquerda no Brasil parece um bando de rebeldes sem
caráter e sem vergonha. A nossa cultura foi roubada, o jornalismo foi
roubado e a música foi roubada. Só vejo um bando de acadêmicos idiotas

dizendo besteiras que aparecem na televisão dizendo coisas que o povo
não entende.
Sempre foi um jornalista combativo e crítico em todas áreas, como
também foi diretor e crítico de teatro. Ele dizia que para escrever entre o
bancário e o banqueiro, sempre defenderei o bancário; entre o lavrador e
o latifundiário, escreverei sobre o camponês e o MST-Movimento dos Sem
Terras; e entre os judeus e palestinos, estarei escrevendo e defendendo os
palestinos.
Em 1978, Fausto Wolff esteve no Líbano e entrevistou o líder Yasser
Arafat, da Organização da Libertação da Palestina. Co Fernando Morais
visitaram os campos de refugiados. Quando voltou publicou o livro ‘Os
Palestinos: Judeus da 3ª. Guerra Mundial’, começou a perseguição dos
sionistas contra Fausto Wolff. Não conseguia emprego nos grandes
jornais. Ele dizia que estes dirigentes israelense querem um holocausto
glorioso contra os palestinos. É uma vergonha por parte do militarismo
judeu, por parte daquilo que aconteceu durante a Segunda Guerra
Mundial, ou seja, deles deixarem se matar daquela maneira. Acho que
eles reagem contra o inimigo errado. Os judeus em vez de continuarem
com ódio dos alemães, sempre transferiram o ódio deles contra os árabes,
principalmente com a comunidade palestina.
Fausto Wolff sempre escreveu seus artigos criticando as atitudes belicitas
israelenses, apoiadas pelos Estados Unidos. Foi o eterno defensor os
direitos dos palestinos viverem nas suas terras e não como refugiados
sofrendo constantes ataques israelenses. A esquerda israelense e os
judeus que vivem fora de Israel é que não querem. Tratam o conflito como
se fosse um jogo de futebol, no qual torcem para o seu time. Em guerra se
torce por quem tem razão e a razão está ao lado dos palestinos, dizia
Fausto Wolff.
O jornalista ficava irritado quando os inimigos diziam que era antissemita,
e ele respondia: nunca aceitei o insulto de antissemita, pois não sou
contra etnia alguma. Alguns do meus melhores amigos são judeus e
antissionistas. O Alberto Dines chegou a escrever um pósfácio em um livro
meu. Sempre questionei perguntando como grande ídolos como Jesus
Cristo, Karl Marx, Freud e Einstein, todos judeus, diriam de uma figura
como Ariel Sharon? E a direita brasileira chamava Fausto Wolff de
relações públicas de Yasser Arafaf.

No livro ‘A imprensa livre de Fausto Wolff’ ele citou uma parte do livro O
apartheid de Israel, do judeu brasileiro Nathaniel Braia, onde dizia: “A
posse de Sharon, apesar dos crimes contra os palestinos, tem permitido
desnudar para os judeus e para o mundo inteiro a dimensão e a gravidade
da doença embutida na ideologia que serviu de base para a usurpação da
Palestina. Através de Sharon podemos ver como a lógica promovida por
essa ideologia está levando à deformação e à desumanização das
instituições de Israel – principalmente o seu Exército – cada vez mais
profundas e perigosas”.
Outro livro que destemido jornalista Fausto Wolff recomendava ao seus
leitores era o livro de Norman Finkelstein, ‘A indústria do holocausto’,
onde diz que os líderes sionistas têm por base “a falsificação e a
exploração do genocídio nazista” para “desviar as críticas a Israel e sua
política indefensável”. Outro grande escritor que Fausto citava no seus
artigos era as opiniões contundentes de Noam Chomsky que escreveu 1O
papel de Israel na política externa norte-americana’.
Fausto Wolff nunca se conformava por que Israel não se transformava
numa democracia com direitos e deveres iguais para todos onde habita
uma maioria de cidadãos que pratica a religião judaica, como no Brasil,
onde a maioria é católica, ou como na Inglaterra, onde a maioria é
anglicana? Fausto achava que é a questão, na superfície, é tratada como
uma questão religiosa quando, na verdade, envolve poder colonial,
econômico, político e o confisco de reservas de água e de petróleo assim
que – como a crônica de morte anunciada – os Estados Unidos começaram
a bombardear o Iraque.
O jornalista com quase dois metros de altura e pesava uns 120 quilos,
sempre foi uma fortaleza, pois na ditadura militar, os agentes da
repressão tentaram prendê-lo, mas não conseguiram porque era muito
grande, e precisava de vários homens para segurá-lo. Fausto nunca se
curvou como disse no velório o presidente do Partido Comunista Brasileiro
Ivan Pinheiro, e o jornalista Mário Augusto Jakobskind que relembrou dos
encontros do amigo em Cuba, onde ele cantava A Internacional, a sua
música preferida dos revolucionários.
Nos último três anos, Fausto Wolff manteve a coluna diária mais lida no
Jornal do Brasil. Em outubro de 2005, Fausto escreveu dois artigos que
incomodou a comunidade judaica, e reclamou com a direção do jornal,

alegando que Fausto Wolff tinha jogado mais lenha na fogueira,
chamando os governantes de Israel de nazistas, assassinos cruéis, e
difamando de forma grosseira Ariel Sharon. Num artigo, Fausto dizia:
“Tem-se a impressão de que os protagonistas desses crimes, desses
assassinatos, desses estupros – vítimas e algozes – vivem num outro
mundo e quando se aproxima de nós podem ser facilmente identificáveis
como cidadãos de segunda categoria, tal qual os judeus eram para os
nazistas e os palestinos são, hoje em dia, para os judeus”.
Outro comentário de Fausto nas suas coluna foi: “Ora, esses patifes todos,
essas aves de rapina, se dizem católicos, protestantes, judeus. Se isso
fosse verdade, bastaria que seguissem os ensinamentos de Moisés e de
Cristo e não haveria um só faminto no mundo. Os verdadeiros
revolucionários, como Jesus, Buda, Giordano Bruno, Galileu, Einstein,
Schweitzer e Russell, entre tantos outros, só são louvados hoje em dia
porque estão mortos e os mortos não perturbam o poder”.
Durante o velório de Fausto Wolff, falei em nome do Comitê da Palestina
Viva Intifada, agradecendo diretamente ao meu lado o proprietário do
Jornal do Brasil Nelson Tanure por ter resistido as pressões da
comunidade judaica e não ter demitido o jornalista da sua redação, pois
Fausto foi a única voz na imprensa brasileira que sempre defendeu a
causa palestina. Foi um jornalista que honrou a classe de jornalistas
brasileiros, que sempre esteve ao lado dos ofendidos e humilhados,
denunciando as injustiças e contrariando os poderosos.
UM EXEMPLO A SEGUIR

Valter Xéu
Editor de Pátria Latina
Conheci Fausto no inicio dos anos 80 sendo que antes o acompanhava na
edição semana do Pasquim on de ele escrevia uma coluna.
Era ele um dos colaboradores do Noticias da Bahia, jornal que eu editava
em Feira de Santana e depois passou a integrar a equipe do Pátria Latina
Desde a fundação do Pátria em fevereiro de 2002 ate a data da sua
morte.

Sempre batíamos longos papos por telefone ou nas minhas idas ou
passagens pelo Rio de Janeiro e compartilhava daquele sentimento de que
jornalismo é a defesa dos fracos e oprimidos e o resto é perfumaria.
Pátria Latina com quase 17 anos de vida. Tem na sua equipe vários Fausto
Wolff e com todos eles, continuaremos firme e forte seguindo fielmente o
estilo de jornalismo do grande Fausto Wolff.
*Sergio Caldieri – Jornalista, escritor e vice-presidente do Sindicato dos
Jornalistas Profissionais do Estado do Rio de Janeiro-SJPERJ
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