Três perguntas para entender a ‘intervenção militar’ de Temer contra os caminhoneiros

Caminhões parados nesta sexta-feira na Via Dutra, no Rio de Janeiro
"Costuma-se dizer que onde tem Brasil, tem Forças Armadas". A fala é do general Joaquim Silva e Luna, atual ministro da Defesa, numa entrevista a jornalistas no fim da tarde desta sexta-feira (25), no Palácio do Planalto. Para Silva e Luna, a população brasileira já está acostumada com o uso das Forças Armadas nas operações de (GLO (Garantia da Lei e da Ordem), e o Exército está em condições de ajudar o governo a desbaratar a greve dos caminhoneiros por ter estruturas e efetivos espalhados por todo o país.
Mas ao contrário do que sugere a fala do ministro, a medida anunciada por ele e pelos colegas Eliseu Padilha (Casa Civil), Sérgio Etchegoyen (Gabinete de Segurança Institucional), Raul Jungmann (Segurança Pública) e Carlos Marun (Secretaria Geral) é extraordinária: esta é a primeira vez que o governo decreta uma operação GLO em todo o território nacional (e não em Estados ou municípios definidos). O decreto — publicado depois das 21h de ontem — dá poder de polícia para as Forças Armadas em todo o País, até o dia 4 de junho.
O uso da força também tem respaldo do Judiciário: no começo da noite, o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes atendeu a um pedido da Advocacia-Geral da União e autorizou o governo a remover manifestantes que estejam bloqueando vias ou estejam protestando nos acostamentos das pistas. A decisão de Moraes — publicada às 19h de ontem — é inclusive mencionada no decreto de Temer.
Moraes também autorizou o governo a multar em até R$ 10 mil reais os caminhoneiros que bloqueiem vias, e R$ 100 mil as entidades que organizem bloqueios. A BBC Brasil traz algumas respostas sobre o tema:
O que acontece agora?
O Ministério da Defesa deve designar um militar para atuar como comandante da operação — ele ficará encarregado de coordenar o trabalho de homens do Exército, da Marinha e da Aeronáutica que atuarão no caso. Em seguida, este comandante estabelecerá um Gabinete de Crise para acompanhar a evolução da situação — neste caso, o gabinete terá representantes do Ministério da Defesa e da Segurança Pública.
A Polícia Rodoviária Federal e a Força Nacional (FN) também atuarão em apoio ao Exército.
Os procedimentos de uma operação GLO estão definidos em um manual do Ministério da Defesa, publicado em 2013. Quando a intervenção ocorre em um único Estado (a pedido de um governador, por exemplo), o militar designado para a operação também assume temporariamente o comando das forças de segurança locais e da Força Nacional.
O próprio manual do Ministério da Defesa diz que o uso das Forças Armadas nas GLOs deve ser "episódico, em área previamente definida e ter a menor duração possível".
Manual do Ministério da Defesa de 2013 diz que GLO tem que ter "área determinada"

Manual do Ministério da Defesa de 2013 diz que GLO tem que ter "área determinada"

Ministério da Defesa / reprodução
Segundo o ministro Carlos Marun, o governo pretende ter a situação normalizada muito antes do fim do decreto — a expectativa do Planalto é que os grevistas sejam totalmente desmobilizados ao longo deste sábado.
O que os militares podem fazer?
Com a GLO, os militares passam a ter as mesmas funções que os policiais — o chamado "poder de polícia".
De acordo com o texto do decreto, as Forças Armadas estão autorizadas a agir para desbloquear rodovias federais em todo o País. Poderão também atuar em estradas estaduais e municipais, desde que haja pedido do respectivo governador ou prefeito.
Em nota, o Ministério da Defesa disse que as Forças Armadas só atuariam para garantir a "distribuição de combustíveis nos pontos críticos", fazer a "escolta de comboios", proteger "infraestruturas críticas" e desobstruir as vias próximas a refinarias de petróleo e centros de distribuição de combustíveis. "O emprego das Forças Armadas será realizado de forma rápida, enérgica e integrada", dizia o texto.
Trecho da Via Dutra estava parado, mesmo após acordo com o governo

Trecho da Via Dutra estava parado, mesmo após acordo com o governo

Tânia Rego / Agência Brasil
Durante a entrevista, porém, os ministros afirmaram que a ação pode ir ainda mais longe: o governo pode "requisitar" temporariamente os caminhões que estejam parados nas pistas; e colocar integrantes das Forças Armadas ou da Polícia Rodoviária Federal atrás do volante para levar os veículos até a garagem dos donos ou ao destino da carga.
"A requisição de bens é um item do número de opções que o governo tem em qualquer circunstância. O que o governo está querendo dizer é que, se não conseguirmos garantir o abastecimento necessário e isso coloque em risco a saúde, por exemplo, haverá requisição. E se as coisas chegarem ao extremo da radicalização, o governo vai usar os instrumentos que tem", disse o general Etchegoyen. Esta medida, porém, não faz parte do decreto de GLO publicado ontem.
O que é a GLO e qual é a diferença para a intervenção no Rio?
As operações de Garantia da Lei e da Ordem, tal como existem hoje, foram criadas por uma lei de 1999, editada durante o governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Segundo a lei, cabe ao presidente da República decretar a operação, sempre que estiverem "esgotados os instrumentos (polícia, bombeiros etc) destinados à preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio".
 Vans de transporte escolar fizeram protesto na Avenida Paulista em SP nesta sexta-feira

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Allan White / Fotos Públicas
Antes disso, militares já eram usados esporadicamente para fazer a segurança interna em situações excepcionais — é o caso da chamada "Operação Rio", realizada naquele Estado no ano de 1994.
A GLO é um instrumento legal diferente da intervenção federal que está em curso no Rio de Janeiro desde fevereiro deste ano. No caso da GLO, o governo federal simplesmente autoriza o uso das Forças Armadas para atividades de segurança interna — todas as ações são controladas diretamente de Brasília. No caso do Rio de Janeiro, Michel Temer indicou um militar — o general Walter Souza Braga Netto - para comandar a Segurança Pública do Estado.
De 2010 até 2017, a GLO foi usada 29 vezes em todo o país — alguns exemplos recentes são a greve de policiais no Espírito Santo em fevereiro passado, e eventos como a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de de 2016 no Rio de Janeiro, e os protestos de rua em junho de 2013.
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