Conheça um pouco sobre o artesanato da Barra

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No encontro do Velho Chico com o rio Grande, exatamente na região do médio São Francisco, está o município baiano batizado com o nome de Barra.
Essa cidade que foi fundada a partir da fazenda Barra do rio Grande, instalada na foz do rio de mesmo nome, antes já se chamou São Francisco das Chagas da Barra do Rio Grande do Sul, Vila de São Francisco do Rio Grande do Sul, em seguida o nome foi simplificado para Barra do Rio Grande, até que finalmente no ano de 1931 passou a se chamar somente Barra.
Uma das coisas que mais chamam atenção em Barra são os artesanatos. O trabalho é feito de forma manual e gera utensílios que além de muito bonitos são úteis, como botijas, panelas, potes e moringas. Na cidade produção de cerâmica é mais concentrada nos bairros de Nossa Senhora de Fátima e Cabeça de Touro e também no povoado de Passagem.

Potes Barra | Crédito: Francisco Costa

A cerâmica utilitária de Passagem e suas técnicas de produção
O artesanato no povoado de Passagem é caracterizado pelo seu caráter utilitário, como boiões, potes, panelas, alguidares, cuscuzeiras, caqueiros, moringas e fogões de cerâmica em variados tamanhos e formatos. Tais objetos são facilmente encontrados nos espaços da vida cotidiana e demonstram a relevância da produção de cerâmica nessa comunidade.
Queima em Passagem | Crédito: Francisco Costa
Queima em Passagem | Crédito: Francisco Costa
Em Passagem, a modelagem de um objeto cerâmico segue processo bastante peculiar: utiliza-se, como uma espécie de forma, uma peça já pronta, em geral rachada ou com algum problema que impeça seu uso no cotidiano. Após removido da forma, ele é completado segundo a técnica do rolete, alisado com cascabu, caroço seco de manga, ou com sabugo de milho. Depois de seca, a peça recebe o engobo, sendo totalmente revestida com tauá, pigmento mineral de coloração vermelha. A seguir, após novo período de secagem, é brunida com pano seco, para receber desenhos a mão livre, feitos com auxílio de um pincel de fiapo de pano, confeccionado pelas próprias artesãs. Finalmente, a peça está pronta para ser levada ao fogo e queimada.
A queima, uma das etapas mais importantes do processo produtivo local, pode ser realizada de duas maneiras: a céu aberto ou no forno. A chamada queima a céu aberto trata-se de uma modalidade de queima, de origem indígena, que de modo geral, é feita coletivamente. Em Passagem, é feita no chão forrado com chapas feitas de latas de flandres reaproveitadas. Sobre elas são colocadas as peças, cobertas com lenha, resultando uma estrutura compacta, que é recoberta com outras folhas de flandres. Ateado o fogo, forma-se então uma grande fogueira que, ao se extinguir, revela as peças, semiencobertas pelas cinzas.
Potes de Passagem | Crédito: Francisco Costa
Potes de Passagem | Crédito: Francisco Costa

Ao esfriarem, os objetos são então recolhidos pelas artesãs. Esse é o momento das boas e das más surpresas. A depender da experiência do grupo, da sabedoria na escolha do dia e da hora para a queima, do tipo de lenha e do modo como é arrumada, da colocação da lenha na fogueira, muitas vezes, ao se retirarem as peças, verificam-se quebras, rachaduras, trincas que podem mesmo comprometer toda a produção.
Esse é um tipo de queima tradicional que poucas comunidades produtoras de cerâmica no Brasil ainda preservam. As tonalidades azuladas e enegrecidas presentes nas peças, tidas como defeitos, são o resultado de uma antiga tradição indígena, o que agrega valor diferencial a esse tipo de artesanato. As manchas dessas peças são marcas de um passado imemorial. São marcas culturais.
De louça de carregação a louça de perfeição – o artesanato de Barra
Devido à excelência de seu porto, durante o tempo em que a comunicação na região se deu majoritariamente por via fluvial, Barra tornou-se importante centro de movimento comercial e social. O fluxo intenso de vapores e gaiolas que aportavam em Barra foi responsável pela comercialização de potes, moringas, filtros, talhas, vasos, enfim, dos vários produtos conhecidos na região pelo termo louça de barro.
Ceramista trabalha em Barra | Crédito: Francisco Costa
Ceramista trabalha em Barra | Crédito: Francisco Costa
Houve um período em que, pelo sistema de encomenda, a louceira confeccionava dúzias de potes à espera do dia certo, quando o barqueiro, passando pelo porto, carregaria a produção já acertada. ‘Louça de carregação’, dizem as ceramistas de hoje. Mal acabada, sem decoração, pois o aumento da produção, aliado à baixa remuneração pelo trabalho, ocasionou a simplificação das formas e seu consequente empobrecimento.
A construção de uma malha viária não favoreceu o município, que permanece até hoje praticamente isolado, dependente do transporte fluvial, pois o acesso por terra é extremamente precário. Diminuindo o número de barcos que aportavam em Barra, diminuíram também a produção de louça e o número de produtores.
Na década de 1970, a Diocese deu os primeiros passos no sentido de reverter esse quadro de estagnação. Posteriormente, o Instituto de Artesanato Visconde de Mauá, órgão do governo estadual responsável pela política de incentivo ao artesanato no estado, chega a região para realizar um trabalho, em parceria com a Diocese e os organismos municipais, que aos poucos, reverte esse quadro.
O apoio à comercialização, realizada nas lojas do Instituto Mauá tem resultado no incremento à produção de potes, moringas, vasos para planta – localmente denominados caqueiros – cachepôs, mealheiros, moringa-moça (em formato de mulher), castiçais, imagens de santos católicos e de orixás do candomblé, e uma infinidade de outras peças que vêm sendo criadas pelos artesãos locais, a partir de suas próprias motivações ou seguindo a demanda dos compradores.  As peças, chamadas de ‘louça de perfeição’, de extrema beleza e executadas com esmero, recuperaram a identidade com os objetos do passado e afastam-se daquelas denominadas de ‘louça de carregação’.



cbhsaofrancisco | textoecia
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